É enganoso pensar que Intervenção Federal no Rio será resolvida em breve
Recentemente o tema da intervenção federal passou a ocupar parte do noticiário brasileiro e, em muitos deles, é visto como a solução para a violência instalada no Rio de Janeiro.
Fora do discurso das instituições, o Estado vive uma guerra civil (termo incorreto para a naturalização do crime organizado) em que acompanhamos o fracasso da política de segurança e de combate ao tráfico. E não é preciso ser cientista social ou político para compreender que as atuações do Estado de longe tratam o problema.
Leia também: Não adianta malabarismo hermenêutico: no Rio, a intervenção é militar
Intervenção federal irregular na segurança pública no Rio de Janeiro
Os dados de vítimas só aumentam, bala perdida e tiroteios fazem parte do cotidiano do carioca, somados ainda com o sentimento de impunidade, abandono, medo e insegurança. Rio, aonde vamos parar?
No mês passado, o Governo brasileiro, após muita polêmica e pouco debate, emitiu um decreto presidencial, após aprovação da Câmara e do Senado, em regime de urgência. O decreto autorizou e regulamentou a intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro que tem previsão até 31 de dezembro deste ano.
Diante disso, a segurança pública do Estado do Rio passou a ser exercida pelo comandante do exército o general Walter Souza Braga Netto. Assim como, a chefia da polícia civil e militar, corpo de bombeiros e administração penitenciária, entre outros.
Desta forma, estas instituições passam a responder diretamente ao presidente da república e não mais ao governo estadual do Rio. Contudo, muito se questiona da constitucionalidade do referido decreto, que agradando ou não, está em vigor.
De início, importante destacar que é a primeira intervenção federal no regime democrático brasileiro, desde 1988, com a promulgação da Constituição Federal. Desde então, o Brasil já havido sofrido uma intervenção militar, que ocorreu em 1964 no governo de João Goulart, período conhecido como ditadura militar.
A intervenção federal é a suspensão da autonomia de um ente federativo em razão de uma situação grave que esteja acontecendo. E está prevista no art. 34 da Constituição Federal, que assim prevê em seu inciso III:
“Art. 34. A união não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
III – pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;
(…)”
O que cabe, somente ao Presidente da República, após ouvir dois órgãos consultivos (conselho da república e o conselho da defesa nacional), conforme art. 84, inciso X da Constituição Federal. E depois o decreto é encaminhado para votação no Congresso Nacional, onde é aprovado apenas por maioria simples (mais da metade dos votos).
Ressalva-se que no período de Intervenção Federal a Constituição não pode sofrer emendas, o que consequentemente deixa a reforma de previdência impossível de ser promulgada.
A intervenção ainda será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal esse ano. Difícil de prever os votos, já que desde a Constituição o STF nunca aprovou uma intervenção estatal.
Inclusive, em outros pedidos semelhantes (como por exemplo: intervenção em presídios – caso do Estado de Rondônia em 2008), os ministros entenderam a intervenção como uma medida extrema, e que para ser decretada deve haver prova da continuidade da crise institucional.
Assim, independente da opinião de cada um, a intervenção está ocorrendo, e as consequências não podem ser presumidas, pois a medida é temporária. Já se observam alguns resultados quanto ao bem estar dos moradores do Rio. Contudo, considerando que a medida tem prazo de validade, é um ledo engano pensar que a situação em que se encontra o Estado do Rio será resolvida em poucos meses.
Para que a intervenção não transpareça apenas como uma medida com fins eleitoreiros, já que ocorre em um momento caótico de violência e de uma crise política em seu governo estadual, dentre outros fatores, é de vital importância que após a retirada das tropas do exército e do encerramento das ações sociais, o Estado volte com um planejamento adequado para ocupar o espaço social que já perdeu após anos de mandatos corruptos.
Mariana Galhardo Frasson é Advogada.
0 Comentários
Faça um comentário construtivo para esse documento.