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20 de Abril de 2024
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    Condenações que não vieram do judiciário: caso Escola Base e Eloá

    Publicado por Justificando
    há 6 anos

    Foto: Reprodução

    Quando falamos de “imprensa”, sua função primordial é a transmissão de informações – as quais necessitam de veracidade. Porém, os noticiários estão repletos de reportagens que tendem a determinadas conclusões, que muitas vezes não estão de acordo com os princípios que norteiam as leis do país.

    Em relação ao judiciário, a imprensa carrega certo valor social, tendo inclusive, o seu direito de livre expressão garantido no art. , inciso IX, da Constituição Federal. Porém, em busca de bons furos e sair na frente da audiência, direitos humanos e de privacidade nem sempre são respeitados.

    Um exemplo de projeto para esses casos, é o Innocence Project: uma iniciativa trazida ao país pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa, que pode trazer a tona erros judiciais emblemáticos e que foram amplamente divulgados na mídia e partir disso fazer uma problematização da veiculação irresponsável de informações processuais e que trazem consequências muitas vezes seríssimas para o resultado do processo.

    Uma série de erros cometidos pela polícia, pelo Poder Judiciário e pela imprensa resultou em um dos maiores escândalos já repercutidos no Brasil: o caso da Escola Base.

    Em março de 1994, donos de uma escola infantil em SP, chamada Escola Base, foram acusados de abusar sexualmente de alunos. Sem provas e investigação, o delegado responsável pelo caso, Edélcio Lemos, chamou a imprensa e revelou que os donos da Escola Base e mais um casal de pais de alunos faziam orgias com as crianças. Logo a notícia repercutiu nos jornais do País, tão rapidamente que os donos da escola não tiveram como se defender, sendo inclusive agredidos, e casa dos sócios da escola, invadida e depredada, e, em seguida, a escola foi saqueada.

    Durante a investigação, a polícia não encontrou provas que pudessem incriminar alguém, porém o exame feito em um dos alunos constatou que os abusos haviam acontecido. Poucos dias depois, o próprio IML afirmou que o exame na criança era inconclusivo, e quando surgiram as primeiras provas de inocência, o delegado responsável foi afastado do caso — que foi encerrado por falta de provas.

    “Quando falamos de Justiça essa checagem é feita ao longo do tempo, quando todas as provas estão encadernadas e passam a ser verificadas com os argumentos da acusação e defesa”, declara Thiago Anastácio, advogado criminalista.

    Porém, esse tempo nem sempre é respeitado. “Por causa de uma informação atravessada de um laudo pericial, foram desencadeadas todas as informações errôneas que foram jogadas na mídia e que acabaram por devassar a vida dos envolvidos”, conta Diego Augusto Bayer, doutorando em Direito Penal, autor de livros jurídicos, e advogado criminalista. As vítimas processaram o Estado e os veículos de comunicação. Algumas ações foram ganhas e outras ainda aguardam julgamento.

    Inconformado com o fim do relacionamento, em outubro de 2008, o jovem Lindemberg Alves invadiu o apartamento onde Eloá Cristina (sua ex-namorada) estava com três amigos, em Santo André, na Grande São Paulo, os fazendo de refém. Ele liberou os meninos logo no início do sequestro, e Nayara Rodrigues, amiga de Eloá, apenas no segundo dia (mas ela voltou para ajudar nas negociações).

    As 100 horas em que Eloá ficou presa foram transmitidas por diversos canais de televisão, em tempo real, como um produto de ação da área do entretenimento. O desfecho se deu quando a polícia invadiu o apartamento e Lindemberg matou a ex-namorada com um tiro na cabeça e outro na virilha.

    Nesse caso, a imprensa não só noticiou como explorou intensamente o sequestro buscando conseguir um furo, realizando inclusive entrevistas ao vivo com o sequestrador.

    Esses casos exemplificam situações em que diversos veículos de comunicação invertem o seu papel na sociedade, prestando um desserviço em massa – criando falsas verdades, divulgando superficialmente fatos do Poder Judiciário, abordando vítimas e criminosos sem fundamento jurídico válido, entre outras.

    Em alguns momentos, a mídia usurpa o papel do Juiz, passando a condenar o réu sem respeitar o devido processo legal, condenando-o muito antes da audiência e da sentença. Assim, cria-se o poder de condenar inocentes à “prisão perpétua”, já que depois da enxurrada de acusações midiáticas que influenciam a opinião pública, estes réus, mesmo absolvidos judicialmente, nunca recuperarão a dignidade plena e enfrentarão grandes dificuldades para retomar a vida que levavam. Segundo o advogado Thiago Anastácio, as consequências podem ser desastrosas. “Ocorre certa destruição social nascida da perda dos laços criados, das cismas que surgem por parte de amigos e famílias, além de outros malefícios de várias ordens.”

    Marina Dias, advogada criminal e diretora executiva do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, compara o funcionamento da justiça, com a construção de uma boa reportagem: “Sem dúvida, assim como a justiça se faz de um equilíbrio entre acusação e defesa, a boa reportagem é fruto de uma apuração rigorosa de todos os lados envolvidos na história.”

    Os veículos de comunicação exercem o papel fundamental de informar e de trazer à tona fatos de inegável interesse público, e se não fosse a liberdade de imprensa, estes ficariam desconhecidos da sociedade. Mas qual o limite? “Não tem manual de como agir com a situação, não acredito em respostas prontas sobre o “limite” de até onde a imprensa deve ir. Acho que exige muita discussão, muita humildade para reconhecer onde estão os erros”, declara Fausto Salvadori Filho, repórter da Ponte Jornalismo.

    Larissa Alves é estudante de Jornalismo da Fapcom, e participante do curso Repórter do Futuro – Cobertura Criminal.

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