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19 de Abril de 2024

Conselho do MPF admite, pela primeira vez, a descriminalização da maconha

Publicado por Justificando
há 7 anos

Conselho do MPF admite pela primeira vez a descriminalizao da maconha

Por 11 votos contra 8, o Conselho Institucional do Ministério Público Federal decidiu ontem, 20, que a importação de sementes de cannabis pela via postal, em pequenas quantidades, não é considerado crime. O caso, histórico por ser a primeira vez que o órgão acusatório defende abertamente a descriminalização para uso pessoal, não vincula os acusadores a agir da mesma forma, mas serve como diretriz.

A Platafoma Brasileira de Políticas de Drogas entrevistou o Advogado Alexandre Pacheco Martins, responsável pela defesa no caso que tratava de importação de uma pequena quantidade de sementes da Holanda.

Martins entende que essa decisão pode ter importantes reflexos no julgamento do Supremo que discute a inconstitucionalidade da criminalização do porte de drogas para uso. Interrompido pelo pedido de vista do Ministro Teori Zavascki há mais de um ano, o julgamento tem um voto favorável a todas as drogas, proferido por Gilmar Mendes, e outros dois apenas pela maconha, proferidos pelos ministros Barroso e Fachin.

Veja a entrevista na íntegra:

PBPD: Hoje, o Conselho Institucional do Ministério Público Federal (MPF) decidiu que a importação de 12 sementes de maconha não poderia ser considerada crime. Qual o impacto dessa decisão?

Alexandre Pacheco Martins: É uma decisão muito importante. Ela muda o paradigma das acusações no país. É a primeira vez que uma instituição como o MPF defende abertamente a descriminalização [para uso pessoal]. Eu nunca tinha visto o Ministério Público falar isso publicamente. Um ou outro até falava nos bastidores, mas eles vão colocar a decisão no papel. Isso é impressionante, é dar autonomia para os procuradores. O órgão falou: “vocês não são mais obrigados a ficar correndo atrás de usuários”.

Evidentemente, isso não significa que daqui para frente todo mundo pode entrar no site e começar a importar – mas as chances de elas serem denunciadas e o caso ser arquivado aumentaram em 200%. Se eu entrar agora no site e importar, muito provavelmente isso vai ser apreendido, vai ser encaminhado para a Polícia Federal, que poderá instaurar um inquérito policial, mas eu nem seria acusado de nada. Seria tudo provavelmente arquivado. Mas o que acontece é que a pessoa ainda não vai poder receber a semente, não vai conseguir fazer uso dela. A gente não conseguiu ainda legalizar – e não é no MP que isso seria decidido. Esse é o próximo passo: ganhar no STF e regulamentar o uso.

A partir de agora, em qualquer ação semelhante o Ministério Público Federal deverá aplicar essa decisão acordada hoje?

Alexandre Pacheco Martins: Não. Essa decisão não tem caráter vinculante, ou seja, ela não obriga os procuradores da República do Brasil inteiro a aplicarem a decisão.

Qual é a função do Conselho Institucional do Ministério Público Federal?

Alexandre Pacheco Martins: A função dele é traçar as diretrizes para o próprio Ministério Público Federal, ou seja, apesar de não ser vinculante, é esse o órgão que formula as diretrizes do MPF. A partir do momento em que o órgão entende que não é tráfico internacional de drogas nem contrabando, ele desobriga os procuradores que até não concordavam, mas acabavam denunciando pela obrigação funcional. A partir de agora só vai denunciar o procurador que concorda, mesmo, que é caso de tráfico. Enfim, as pessoas que entendem dessa maneira podem continuar aplicando isso, mas grande parte dos procuradores já entendia que não era [tráfico], mas batia na Justiça e alguns juízes falavam “Você pode até achar que não é, mas eu acho que é. Então vou mandar isso para o seu chefe”. E quando chegava no “chefe”, em última análise acabava indo para esse Conselho Institucional – que hoje tomou essa decisão.

PBPD: Nesse caso específico, a chance desse réu ser absolvido na Justiça é grande.

Alexandre Pacheco Martins: Na verdade, não tem como falar em absolvição porque ele não vai ser processado. Ele nem sequer vai virar réu. Ele foi mero investigado por tráfico internacional e, depois dessa decisão, ele é uma pessoa comum como qualquer outra pessoa do mundo.

PBPD: O senhor acha que essa decisão de hoje pode ter impacto no julgamento do RE 635.659, que pode descriminalizar a porte de drogas para consumo pessoal?

Alexandre Pacheco Martins: Acho que pode ter um belo reflexo. Ela influencia, mas não determina o resultado. Mas a decisão dá, inclusive, amparo para os ministros que estiverem inseguros: o próprio órgão acusatório oficial do Brasil entende que casos como esse não têm grande repercussão na vida prática das pessoas.

PBPD: Um dos nossos seguidores comentou em nossa página que a decisão de hoje foi pautada pela inexistência de THC na semente da maconha. Como o senhor vê esse argumento?

Alexandre Pacheco Martins: O julgamento foi bem mais profundo do que isso: eles definiram que não é nem tráfico nem contrabando. Não é tráfico pela inexistência do THC, de fato. Mas cada procurador foi aprofundando em um sentido. Alguns foram no sentido de não ter THC, outros falaram da interferência do Estado na vida privada. Cada um falou em um sentido, mas a decisão final foi a de que não é tráfico porque não tem THC e que, portanto, a semente de maconha não pode ser considerada a droga em si. Num segundo ponto, entendeu-se que não era contrabando também porque o que a gente chama de semente de maconha, biologicamente é um fruto. Se todas as sementes são proibidas exceto as permitidas, os frutos seguem uma lógica diferente: eles não necessariamente são proibidos de serem importados. Eu sustentei nesse sentido e uma das procuradoras até acolheu esse argumento. Mas a maioria entendeu que como a quantidade é muito pequena e o MPF entende que, num paralelo com o cigarro, pode-se importar até 153 caixas de cigarro sem configurar contrabando, não faz sentido você criminalizar todas as sementes de maconha. É muito pouco. Não tem relevância penal essa quantidade.

PBPD: Era esperada essa decisão do Conselho Institucional do MPF?

Alexandre Pacheco Martins: Esse julgamento começou em agosto. Quando eu fui lá para sustentar, eu estava meio sem esperança. Mas modéstia à parte, a discussão foi tão bacana, a gente trouxe pontos tão interessantes, que eu vi alguns procuradores nos questionando e depois concordando com nossos argumentos. E aí eu vi várias pessoas indo nesse sentido, foi impossível não se empolgar.

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Entendo que as leis tendem a evoluírem, devem acompanhar os acontecimentos da sociedade em um todo, pois bem, a partir dessa posição pontual, achar que o porte de drogas, em pequena quantidade e para consumo pessoal deve ser descriminalizada é uma decisão perigosa, pois abre caminho para um uso descontrolado. Considerando também que, o uso de droga não têm grande repercussão na vida prática das pessoas. segundo o advogado Alexandre Martins, é uma demonstração que realmente conceitos estão mudando para pior. É absolutamente claro que o efeito que as drogas causam no comportamento das pessoas, podem ocorrer sim, muitos problemas para a saúde pública e para a sua convivência social e familiar, não podemos ser cínicos em escondermos, tipo avestruz, as consequências. “vocês não são mais obrigados a ficar correndo atrás de usuários”. Termino meu comentário com a frase que o respeitável advogado acima destacou ter sido do MP. Entendendo perfeitamente o conteúdo frase, "o usuário não será mais perseguido por vocês, a corrida terá uma inversão, o usuário ficará sempre correndo atrás do traficante, como sempre fêz". continuar lendo

Não entendo qual é a preocupação com o uso "descontrolado", Podemos comprar maconha em qualquer lugar, a qualquer hora do dia ou da noite. O governo não sabe quanto foi produzido, não sabe não há controle de qualidade, nem há regulação alguma sobre o que chega aos cigarros do "consumidor", ou seja, o consumo não tem como ser mais descontrolado. Se remontarmos o trafico de Whisky nos EUA quando qualquer solução alcoólica era vendida como bebida. O que aumentou a criminalidade, fortaleceu as mafias e criou um mito cinematográfico chamado Al Capone. Os conservadores temiam que a legalização do álcool implodiria moralmente e economicamente o atual país que depois se tornaria a nação mais poderosa do mundo (apesar da bebida), mas quase 100 anos depois qual é a lição que tiramos da descriminalização do álcool em 1933? continuar lendo

Carlos uso descontrolado? Os países que tem a maconha liberada perceberam uma diminuição nos usuários, eles fazem campanhas de conscientização com o dinheiro que ganham dos usuários, geram empregos, recebem impostos....

A maconha é 400 x mais inofensiva que o cigarro, é praticamente impossível ter uma overdose com esta droga...

A maconha não é feita só pra fumar, ela pode ser usada como medicamento, sua fibra pode ser usada para roupas, calçados, papel, combustível, enfim ela passa por um preconceito enorme pois era utilizada pelos índios, africanos e produtores rurais, por isso ela foi proibida....

Sempre lembro daquele ditado popular tudo o que é proibido é mais gostoso. continuar lendo

Acredito na liberdade, no livre arbítrio de fazer o que a pessoa quiser! O álcool sempre foi liberado e é uma droga bem pior do que a cannabis, além de retirar o poder das mãos dos traficantes já que a maconha é a droga mais usada no mundo, além de gerar renda, fazendo roupas, velas de barcos, muitas coisas são uteis nessa planta além de ser salvadora de inúmeras doenças e as pessoas se entupindo de rivotril continuar lendo

da exposição acima entendo um avanço miraculoso com relação ao respeito à vida privada, a liberdade de escolha, o que só vem diminuir o uso da máquina judiciária. continuar lendo

Até Tú MPF!!!! Qual rumo tomará o Brasil? Até o MPF, deixando de exercer o seu dever de persecução criminal e, parece, tentando aceitar como legal o ilegal? continuar lendo

onde eles vão enfiar tantos usuários de maconha no BRASIL? Tirando o lugar de um ASSASSINO, ESTUPRADOR, PSICOPATA, nosso país não tem dinheiro para isso, tem que liberara mesmo, nenhum ser humano muda a sua índole por causa de nenhuma droga, muito fazer estrucidades sem nunca usar nada continuar lendo

Eu não sou contra a liberação do consumo mas, pode-se usar várias pessoas para comprarem em pequenas quantidades e plantar uma lavoura.
Porém, acredito que se cada usuário tiver o plantio de seu consumo, encerra-se o tráfico, a criminalidade e etc.
Quanto à facilidade que muitos alegam que os usuários irão ter para consumir e correndo o risco de se aumentar o número de usuários, pode ser comparado aos usuários do cigarro, hoje temos menos fumantes que antes é o proibido é mais atrativo. continuar lendo