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26 de Abril de 2024
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    No Judiciário Brasileiro, soltar alguém é incrivelmente mais difícil do que prender

    Publicado por Justificando
    há 8 anos

    Há muito tempo, ninguém sabe quando ao certo, ou se foi algo que o tempo a conta gotas fez questão de acontecer, as maioria das pessoas que lidam com o processo criminal, cujo acusado está preso, pararam de ver aquele monte de papel como a angústia de alguém por sua liberdade e a ansiedade de uma família em ver seu filho em casa, mas simplesmente como aquilo que aos olhos parece: um monte de papel sem muito significado, a não ser a importância burocrática.

    Para ilustrar, vou contar-lhe uma breve história da saga cotidiana para se conseguir a liberdade de uma pessoa presa: para ser ouvido, o acusado precisa de um advogado ou de uma advogada, que precisa escrever um pedido para ser analisado pelo juiz (a). Por isso, sabendo que sua Excelência tem outros mil pedidos iguais, como também para ressaltar o caso e explicar as peculiaridades, é necessário despachar - isto é, levar o pedido pessoalmente e o explicá-lo ao magistrado (a). Cientificado (a), a Excelência determina que o Ministério Público fale também nos autos. Por isso, o monte de papel sai do gabinete judicial e vai direto para o cartório da vara; lá, entra em uma fila para uma escrevente confirmar o recebimento do processo e encaminhá-lo para outro escrevente (o do MP). Enviado, o processo entra em outra fila, a do Escrevente do MP, cujo trabalho também será o de confirmar o recebimento dos autos e encaminhá-los ao promotor (a) de justiça, o qual recebe o processo para análise, que pode durar dias.

    Acha que acabou? Nem de longe. Após a análise, o promotor devolve o processo ao escrevente do MP, iniciando o rito reverso até que, depois de outros tantos dias, o monte de papel chega ao Juiz, o qual, ao menos na cidade de São Paulo, trabalha das 13 às 19h - fora a hora do lanche.

    Aqui o final da saga se divide em dois caminhos possíveis. Primeiro: o juiz, contrariando as estatísticas e experiências, concede a liberdade. Nesse caso, acalme-se, o réu ainda não será solto. O pedido volta para o cartório para o escrevente dizer que recebeu e comunicar a decisão ao presídio/distrito policial por fax (FAX!?), ou por telefone (cujo atendimento a rotina mostrou ser um milagre). Acabou? Não... O (A) carcereiro (a) recebe a comunicação e, ao seu vagaroso tempo, encaminha o preso ao IML - Instituto Médico Legal, para que depois ele volte ao presídio, assine meia dúzia de documentos e é solto. Nesse primeiro cenário, não é necessário dizer que para que a pessoa seja libertada, aquela distante decisão do juiz deve sair, no máximo, até as 17h. Caso contrário, que comam brioche.

    Segundo: o juiz (a), agindo dentro da normalidade prática, denega o pedido de liberdade. Neste caso, boa sorte no Tribunal de Justiça...

    Prender, entretanto, é pra lá de mais fácil. Quando se trata de um suposto flagrante, o acusado já chega às mãos e tentáculos judiciais preso, eliminando praticamente o texto inteiro escrito até aqui. De outro lado, quando há um pedido de prisão preventiva ou temporária, um pedido só do delegado ou do promotor basta para o juiz, o qual não determina que a outra parte se manifeste - eliminando uma enormidade de tempo. É tão desproporcional a coisa que a magistratura tem outro horário de trabalho - full time para prisão. Se para ser liberto, o acusado tem que rezar para seu pedido cair na mão do magistrado na hora da lei do estágio, para ser preso nunca há horário ruim. Há plantão de manhã, plantão à tarde, à noite e na madrugada. Sim, imagine um réu pretender sua liberdade na madruga, no final de semana...

    Ser inimaginável soltar alguém na madrugada mostra como a Justiça brasileira valoriza mais (muito mais) a prisão do que a liberdade. É um dos claros demonstrativos de um país que acelera para ocupar o pódio mundial de campeão em número de presos.

    Deveria ser o contrário em uma nação fundada na liberdade como direito e garantia fundamental. Entretanto, quem advoga pelo menor tempo que seja já percebe como, de fato, é a realidade brasileira. Prende-se em um minuto; solta-se em muitos meses.

    E há quem fale em impunidade...

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/no-judiciario-brasileiro-soltar-alguem-e-incrivelmente-mais-dificil-do-que-prender/296851625

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